segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Lista secreta: alvos no Brasil

Site polêmico revela relação de locais ‘vitais’ aos EUA que poderiam atrair ações terroristas

Washington (EUA) - Pesadelo do governo dos Estados Unidos, o site WikiLeaks divulgou ontem uma lista secreta de locais estratégicos para os EUA e que podem ser alvos de terrorismo. Desta vez, sobrou até para o Brasil: o documento inclui cabos submarinos e jazidas de nióbio e manganês em estados do País, inclusive no Rio.

A lista foi elaborada em 2009, após o Departamento de Estado americano pedir a todas as missões diplomáticas do país no exterior informações sobre instalações e recursos “cuja perda poderia impactar criticamente a saúde pública, a segurança econômica e/ou a segurança interna dos EUA”.
Arte: O Dia
Arte: O Dia
O pedido foi feito no âmbito do Plano Nacional de Proteção à Infraestrutura, que busca proteger recursos vitais a fim de evitar possíveis ações terroristas e responder bem a desastres naturais. Por isso, segundo especialistas, a divulgação da lista pelo WikiLeaks seria um ‘presente’ para organizações terroristas.

Nióbio para uso militar

No Brasil, o documento cita cabos de comunicação submarinos com conexões no Rio de Janeiro e em Fortaleza, além de jazidas de minério de ferro, manganês e nióbio em Minas Gerais e em Goiás. Não há detalhes sobre o porquê de esses locais serem importantes para os EUA. Entretanto, sabe-se que o nióbio é essencial para a indústria militar: seria usado na construção de motores de mísseis e de caças de alto desempenho, por exemplo.

O elemento também pode ser usado na construção de supercondutores, um campo de aplicação ilimitado — que vai desde a criação de novos componentes eletrônicos para computadores de alto desempenho, a sistemas de levitação magnética para trens de alta velocidade.

Já o manganês é essencial para quase tudo — sem ele o alumínio só serve para produzir panelas e o aço se torna um metal frágil. Na liga com cobre e antimônio, resulta em uma espécie de imã, usado em pesquisas científicas de precisão. Vidros de alto grau de pureza usados em laboratórios e elementos ferrosos livres de detritos também dependem do manganês.

Até 88% das reservas de nióbio do mundo estão em território brasileiro — boa parte na mina de Catalão, Goiás, e cerca de 80% do total restante na Amazônia e Mato Grosso. O Brasil é o 2º produtor de manganês do mundo.

Entre outros locais estratégicos citados no documento estão oleodutos, centros de comunicações, portos, recursos minerais e empresas de importância estratégica em países da África, Ásia, América e Europa. A lista inclui empresas médicas francesas e belgas e companhias italianas e australianas de soro antiofídico, além de fornecedores de vacina contra varíola.

Dono do site vai se entregar à polícia

Fundador do WikiLeaks, o australiano Julian Assange pode se apresentar à polícia britânica em breve, informou ontem o advogado que representa o site em Londres. O anúncio foi feito em momento de grande pressão sobre Assange, que pode estar escondido na Inglaterra.

Também ontem, o secretário de Justiça dos Estados Unidos, Eric Holder, disse que o governo Barack Obama avalia que leis podem ser usadas contra o fundador do site, incluindo as relacionadas à espionagem. Assange também é procurado pela Interpol, mas por outros motivos: a extradição do australiano é pedida pela Suécia, onde é acusado de estar envolvido em um caso de estupro e assédio sexual.

“Julian Assange não é acusado de nada”, disse o advogado Mark Stephens. “Estamos negociando um encontro consentido com a polícia para facilitar o depoimento”.
(Notícia publicada no jornal O Dia, Rio de Janeiro, em 07/12/10)

domingo, 12 de dezembro de 2010

Espaço aéreo em Brasília é vulnerável, dizem EUA


Telegrama da embaixada vê risco de ataque com aviões a prédios públicos

Despachos evidenciam preocupação americana com segurança no uso de lei que permite abate de aeronaves no Brasil

FERNANDO RODRIGUES
DE BRASÍLIA

O espaço aéreo de Brasília é vulnerável ao ataque de terroristas, que podem usar um avião para atingir e destruir prédios públicos na capital federal, diz um telegrama secreto da embaixada dos Estados Unidos no Brasil.
Datado de 28 de março do ano passado, o despacho diplomático faz parte do lote de milhares de telegramas obtidos pela organização WikiLeaks (wikileaks.ch). A Folha é uma das sete publicações no mundo que têm acesso a esse material antes de ele ser divulgado no site.
O então embaixador dos EUA em Brasília, Clifford Sobel, fazia comentários sobre a aplicação da Lei do Abate no Brasil. A legislação é de 1998. Entrou em vigor de maneira plena em 2004, quando foi regulamentada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Sobel relatava aos seus superiores um episódio ocorrido em 12 de março do ano passado, quando um homem roubou um monomotor em Luziânia (GO), cidade a 56 km de Brasília.
O pequeno avião era tripulado só pelo piloto e uma menina de 5 anos, sua filha. Ambos morreram quando o Embraer EMB-712 caiu no estacionamento do maior shopping center de Goiânia.
O interesse dos norte-americanos é sobre como a Força Aérea Brasileira coloca em prática a Lei do Abate.
Para que o piloto de um caça da FAB possa atirar para destruir um avião hostil é necessário passar por vários procedimentos -até uma ordem presidencial.
Tudo funcionou no caso do avião roubado em Luziânia. Não houve disparos contra o pequeno avião, que foi acompanhado por um Mirage e por um T-27 Tucano, ambos da FAB.
O embaixador Sobel fez um comentário: "[O caso] Iluminou uma vulnerabilidade para ações com potencial terrorista, dado que a decisão [de atirar] não teria sido tomada a tempo de impedir o piloto se ele tivesse condições de jogar seu avião em um alvo, ou outro prédio, inclusive em Brasília".
O diplomata norte-americano explica haver uma lacuna na regulamentação da Lei do Abate no Brasil. A regra detalhada sobre ataque a aviões hostis se refere sobretudo a casos em que há suspeita de transporte de drogas ilícitas "na vasta região Norte do Brasil, e não a potenciais ataques a cidades".
Sobel conclui que os brasileiros "consideram os seus procedimentos de abate eficazes, mas devem buscar formas de acelerar o processo decisório durante um potencial ataque terrorista".
Nesse caso de Goiânia, a FAB de fato temeu um possível atentado igual ao 11 de Setembro de 2001, quando aviões foram sequestrados e jogados sobre o World Trade Center, em Nova York, que foi destruído, e o Pentágono, em Washington.

INFLEXÃO As observações críticas da diplomacia norte-americana são em certa medida paradoxais. Agora, falam sobre a necessidade de o país ter mais celeridade na tomada de decisão para abater aviões.
Num passado recente, porém, o governo dos EUA se opunha fortemente ao Brasil ter uma Lei do Abate. Essa pressão deixou o país muito tempo sem regras.
Sem a lei, durante anos havia relatos sobre os milhares de voos clandestinos no espaço aéreo brasileiro.
A oposição dos EUA ocorria pelo temor de que a FAB não tivesse condições de discernir sobre quais seriam aviões de fato hostis e que mereceriam ser derrubados.
Aviões militares norte-americanos no passado costumavam entrar sem avisar no espaço aéreo brasileiro, sobretudo na fronteira norte.
Essas aeronaves em geral trabalhavam em cooperação com os governos vizinhos, como o da Colômbia.
A legislação foi aprovada em 1998, mas sua regulamentação ficou parada até 2004. Nessa época, as Forças Armadas brasileiras concordaram em fazer um acordo de cooperação: anualmente, oficiais dos EUA visitam instalações do controle aéreo nacional e falam com os que teriam de agir em caso de aplicação da Lei do Abate.
De posse dessas informações, a cada ano, o presidente dos EUA tem de renovar a "Presidential Determination" (ordem presidencial) reconhecendo que o Brasil tem procedimentos de interdição e abate de aviões seguros, que "protegem contra a perda de vidas inocentes".
Sem essa ordem da Casa Branca, não poderia haver troca de informações sobre parte do tráfego aéreo entre o Brasil e os Estados Unidos.

(Notícia publicada na Folha de São Paulo em 12/12/10)